Depois de ler esta peça, é evidente que o país entrará em espiral, em ritmo lento, consumindo-se devagar entre eleições para o PSD (um fenómeno), vida interna do PS (outro), eleições presidenciais e o campeonato de futebol. Isto não é ligeireza nem desinteresse. Evidentemente que estou de acordo com o Luís M. Jorge: não eram precisas «as escutas» para ver o óbvio. O óbvio é o óbvio — vem todos os dias nos jornais e basta fazer uma leitura da propaganda dos últimos três anos para o perceber. Não é preciso invocar conspirações extraordinárias; o puzzle está ao alcance de qualquer um e até do embaraço dos apaniguados. O argumento de que o país votou assim e que não se pode fazer nada contra isso não me comove extraordinariamente. Transformá-lo em república de juristas, debulhando o segredo de justiça (que flutua bastante, basta lembrar), discutindo pequenas censuras, e as conveniências de advogados e defensores da ordem, é o pior que nos pode acontecer. O problema do país não é jurídico nem legal — é político. Não é preciso ler o Sol nem as decepcionantes defesas oficiosas do regime, e do centrão, para o perceber. Desde há três anos que o problema é mais vasto. É a indiferença do país (tanto em relação ao endividamento externo de 177 mil milhões, como à propaganda e à mistificação, como a questões elementares de direitos e liberdades); a impunidade do poder e do Estado; o carácter manhoso da corte que Sócrates espalhou por uma rede influente e distribuída pelo Estado e pelas corporações; a rede de interesses e compromissos que junta negócios, influência na imprensa e decisão política; um PSD pouco empenhado e, sobretudo, pouco hábil que espera que Sócrates caia de maduro. A gritaria não vai poupar ninguém.
[FJV]
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