sábado, 27 de fevereiro de 2010

Sugestões


A Pordata é uma notável realização da Fundação Francisco Manuel dos Santos cuja visita se aconselha e que procura "tentar responder às necessidades de informação credível, tantas vezes dispersa e de acesso nem sempre simples por parte de um público o mais amplo possível, independentemente das suas competências em lidar com estatísticas (...) São doze os temas com que se inicia a Pordata: População; Saúde; Educação; Protecção Social; Emprego e Mercado de Trabalho; Empresas e Pessoal; Rendimento e Despesas Familiares; Habitação e Conforto; Justiça; Cultura; Contas Nacionais; Contas do Estado. Cada um destes temas está subdividido em vários subtemas, que incluem múltiplas séries de dados estatísticos. (...) Os dados de base disponibilizados na Pordata são da exclusiva autoria de entidades oficiais com competências de produção de informação nas áreas respectivas"

"No final de Agosto, os italianos negociaram a rendição dos bascos. Conforme acordado, as principais figuras políticas bascas deviam zarpar do porto de Santoña a bordo de dois navios britânicos. No entanto, quando as embarcações deixaram o porto, Franco deu ordens para que navios nacionalistas as bloqueassem, tendo depois exigido que os prisioneiros lhe fossem entregues. Após um impasse de vários dias, os italianos relutantes acabaram por concordar. Os nacionalistas trataram de organizar julgamentos sumários, findos os quais centenas de pessoas foram fuziladas".
"FRANCO" de Michael Streeter: um livro pequeno e bem escrito.

[FTM]

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Música política


O artigo de James Taranto no Wall Street Journal é divertido e enganador.
James Taranto parte de um excerto do mais recente livro de Philip Ball em que este afirma que a música clássica moderna, depois de Schoenberg, é mais difícil para o cérebro em virtude da sua atonalidade. Acrescenta-lhe uma "colherada" de David Huron que entende que a música clássica moderna, por ser imprevisível na sua evolução, frustra os ouvintes, pelos constantes falhanços nas antecipações que fazem, o que os impede de terem o prazer da correcta antecipação .
Deste "mix" conclui James Taranto, que a música clássica moderna não dá prazer ao ouvinte (como se o prazer só pudesse resultar da correcta antecipação) e é uma fraude ...
E, numa enganadora analogia, James Taranto conclui que também o plano de saúde de Obama é uma fraude. Um artigo divertido e enganador.
[FTM]

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Sugestões


Amin Maaalouf é um autor conhecido, seja como romancista ou ensaísta. Este livro é uma obra bem escrita que nos dá uma visão da realidade bastante apurada, nesta época de erosão das democracias e da emergência de um impasse histórico no mundo árabe. As soluções, claro, não existem embora Amin Maalouf procure a redenção na cultura e na construção da solidariedade a nível da humanidade.
Claro que vale a pena percorrer esta história da humanidade guiados por Maalouf.
[FTM]

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Sentido de Oportunidade - II

É verdade.
E, no entanto, era um popular na Madeira que, face à tragédia, comentava: "... havia ali uma ribeira... fizeram-se as estradas..."
Verdade seja dita que não vi as declarações do representante da QUERCUS e, às vezes, a forma como se diz e o que se diz, matam o que se queria/deveria dizer.
[FTM]

Sentido de oportunidade

No meio do caos e da catástrofe, a primeira das prioridades é cuidar dos vivos e ajudar. Um dirigente da Quercus aproveitou para, no meio do caos e da catástrofe, lembrar que a Quercus tinha razão.
[FJV]

Helena









Por motivo de doença, João Pereira Coutinho não participa no programa deste fim-de-semana; em sua substituição junta-se à mesa Helena Matos. Bem-vinda. E rápidas melhoras para o João.

Ética e liberdade e comissão de inquérito. Tudo na Bimby.

É visível, finalmente, que o debate sobre a liberdade de expressão no Parlamento está a seguir o caminho esperado, o da dissolução pura e simples. A liberdade de expressão — reduzida à questão da «liberdade de imprensa» — não é coisa para discutir no parlamento, entre pares com telhados de vidro e departamentos de comunicação & imprensa. Chamar este ou aquele, ouvir considerações, exemplos que dão vontade de rir, proclamações de ética geral, é mais do que metade do caminho para não chegar a lado nenhum. Ora, não chegar a lado nenhum, se não me engano, é coisa que favorece o estado de coisas. Para quem criticou a declaração do primeiro-ministro, bem pode limpar as mãos na parede. Ficámos cientes. Mas, pior do que isso, é transformar epifenómenos políticos em tramóias criminais e juntar tudo na Bimby. Velocidade turbo.

[FJV]

Parabéns a vocês

Quando a oposição avisou que vinha aí uma comissão parlamentar, eu tremi. Quando acrescentou que a comissão parlamentar iria discutir a liberdade de expressão em Portugal, desmaiei. Discutir a liberdade de expressão, de tão absurdo e vago, significa não discutir nada de especial.
No limite, o exercício permite apenas números de pantomina, ajustes de contas e meras exibições de estados de alma, que não tocam no nervo essencial. E o nervo, convém lembrar, é conhecer as predações económicas do Estado nos órgãos de comunicação social, o primeiro passo para condicionar (e, em certos casos, eliminar) a proclamada liberdade de expressão. Por outras palavras: o condicionamento da liberdade de expressão será sempre um fim, e não um meio, de um poder político que não conhece os seus higiénicos limites. Sem separar as águas e definir, com rigor, o objecto da investigação, o resultado não podia ser outro: uma coisa pastosa e nula, que suja mais do que limpa. A oposição está de parabéns e o governo, como sempre, agradece.
[JPC, aqui]

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Mini-leituras

Não sendo muito dado à filosofia, não posso, desta vez, deixar de saudar o texto de José Gil na revista Visão. O título não ajuda: «O não-dito da suspeita», mas a primeira frase arranca bastante bem: «Desenvolve-se actualmente no Ocidente, um processo inexorável de erosão da democracia», e vai por aí fora. Basicamente, do seu lado, fica a conhecer uma visão panorâmica da realidade em que estamos mergulhados, cheia de significado e significados.
No post «Dissolvências» no blog Funes, el Memorioso , cuja leitura igualmente se recomenda, num texto brilhante e e contundente, afirma-se: «Se quisermos voltar a dar às instituições um módico de dignidade e de decoro, ninguém - absolutamente ninguém - pode, no topo da hierarquia do Estado, permanecer onde está. Tem que haver uma varridela geral. E os lugares todos desinfectados com creolina, antes de voltarem a ser ocupados.»
Será, de facto assim? Não será uma questão de erosão e sim de dissolvência?
[FTM]

Uma parábola

No Brasil, o escândalo do mensalão e o processo judicial que se lhe seguiu foi a crise mais séria do governo de Lula. As autoridades tentaram impedir a imprensa de publicar escutas; mesmo assim, não era e não foi necessário (até que foi pedido, judicialmente, que certos jornais fossem impedidos de dar notícias sobre fulano e cicrano — situação que ainda se vive, creio eu, no Estado de São Paulo). O PT, o partido de Lula, além das organizações leninistas que o acompanham (a CUT, o MST, etc.), lançaram os piores ataques contra a imprensa (sobretudo a Veja, a Folha de S. Paulo e o Estadão), com os militantes, irados, queimando jornais e revistas na rua. Nada feito. A imprensa tinha feito o trabalho de casa e é justo dizer que nenhum jornal português lhes chega aos calcanhares. A cada mentira dos dirigentes do PT, apareciam fotos e documentos que os desmentiam. Lula nunca foi atingido; Lula não sabia de nada, Lula era inatacável. O tesoureiro do PT foi demitido e cassados os seus direitos políticos. José Dirceu, cujo gabinete ficava ao lado do de Lula, foi demitido e cassados os seus direitos políticos. Lula não sabia de nada e falava de uma campanha contra o filho eleito do povo. José Genoíno, presidente do PT, foi demitido. Lula era inocente, apesar das dúvidas da imprensa e de manifestamente ser impossível que não soubesse de nada, se os personagens pertenciam ao núcleo duro do seu governo, se se encontrava com eles todos os dias, se lhes telefonava a qualquer hora do dia e da noite, se trabalhavam ao seu lado. Lula nunca soube de nada. O povo tinha mais com que se preocupar. Às vezes, o povo pode querer que as coisas sejam assim mesmo.
[FJV]

Na sondagem

José Sócrates, como diz parte da oposição, tem condições para continuar a exercer o cargo de primeiro-ministro?
  • Sim > 17%
  • Não > 61%
  • Deve submeter uma moção de confiança na AR > 14%
  • A questão não se coloca > 5%
Pode votar na coluna da direita.

Um cheque em branco

Com a autoridade política desfeita em cacos, o primeiro-ministro mandou chamar o partido. Para quê? Para conseguir ‘unidade’, ou seja, uma espécie de polícia de choque que o proteja das negras trapalhadas da vida. Um líder, por definição, lidera. Mas Sócrates já não lidera o seu rebanho; esconde-se atrás dele, o que não deixa de ser uma confrangedora exibição de tibieza e fragilidade.
E o rebanho? O rebanho parece disposto a caminhar para o matadouro, ignorando por completo esse fantasma tremendo que se chama ‘dia de amanhã’. Porque existem ‘dias de amanhã’ que o PS, logicamente, desconhece. Que fará o PS, este PS comprometido e arregimentado, se a imprensa continuar a retirar da cartola coelhos que mais parecem ratazanas? Que fará o PS, este PS silencioso e timorato, quando a degradação política, já alarmante, atingir níveis insuportáveis? Fingir que não tem nada a ver com nada?O PS não se prepara para apoiar Sócrates. Prepara-se, coisa pior, para lhe passar um cheque em branco sem exigir fiador. É o princípio da falência partidária.
[JPC, aqui]

Vida privada, vida íntima

Do leitor Luís Barata:
«Há uma distinção importante que não tem sido feita em toda esta temática e que é importante: "Vida privada" não é "Vida íntima"- são esferas diferentes. E há elementos da "vida privada" dos governantes, designadamente os amigos que têm e os "esquemas" de que vão tendo conhecimento, que não são despicientes para a avaliação política.
Por outro lado, não deve ser o "segredo de justiça" visto como uma vaca sagrada que importa proteger a qualquer custo. É um segredo que deve ceder perante valores mais altos, como em qualquer caso de colisão de direitos.
E o que temos visto é que o segredo de justiça está a ser usado como um escudo protector perante revelações politicamente catastróficas...»

O debate

Com o devido respeito, nem todas as questões políticas estão sujeitas a escrutínio parlamentar e a comissões de inquérito (nascidas de maiorias flutuantes) já suficientemente desacreditadas. A ideia de discutir a ‘liberdade de expressão’ no parlamento é uma pequena vingança que pode sair furada ou afogar-se no meio do ruído e da guerra governo-oposição. Os portugueses, infelizmente, não são muito sensíveis às questões de liberdade de imprensa nem de direitos cívicos; conformam-se. Há demasiados jornais proibidos, perseguidos e odiados na nossa história. O poder aproveita essa tradição iliberal portuguesa e reduz o problema a inveja, maledicência e conspiração; a oposição, que tem telhados de vidro, nem sempre escolhe bem o terreno onde pisa. O debate devia ser cá fora.
[FJV, aqui]

Leituras

«José Sócrates tem de decidir se quer deixar de ser primeiro-ministro antes ou depois das Presidenciais. À sua direita tudo se prepara para o derrubar depois da reeleição de Cavaco Silva. As primárias do PSD apontam nesse sentido. À esquerda a sua simples manutenção no cargo de chefe do governo impede praticamente a vitória de qualquer candidato presidencial deste quadrante, desde Manuel Alegre a Fernando Nobre, ou qualquer outro que entretanto apareça. A lógica do combate político levaria a que fosse o próprio Sócrates o candidato presidencial do PS governamental, tantos e tão públicos foram os desentendimentos entre São Bento e Belém.»
José Medeiros Ferreira

«A questão é política e deve ser tratada como tal. Não faz por isso sentido o argumento formalista, que manda aguardar pela reunião da assembleia-geral da empresa. Uma coisa é clara: quanto mais tempo demorar o silêncio do primeiro-ministro sobre o tema, pior. O ónus da explicação está do seu lado e Sócrates tem demorado demasiado tempo a responder.»
Pedro Adão e Silva

«O primeiro-ministro não vai deitar a toalha ao chão mesmo que seja expulso de São Bento com alcatrão e penas. A resiliência é o seu traço de carácter mais interessante, o único em que alcançou grandeza. Não o veremos lamentar, como Guterres, a pátria que não o merece. Sócrates não será embaixador na ONU, alto-comissário para os pobrezinhos, nem eminência parda do auxílio à Serra Leoa. Pelo contrário, vai atazanar o país nos próximos dez anos, ainda que o país não o queira e o abomine. A sua sombra vagueará pelo PS como o espírito mau da defunta Rebecca em Manderley.»
Luís M. Jorge

O ponto da situação.

Depois de ler esta peça, é evidente que o país entrará em espiral, em ritmo lento, consumindo-se devagar entre eleições para o PSD (um fenómeno), vida interna do PS (outro), eleições presidenciais e o campeonato de futebol. Isto não é ligeireza nem desinteresse. Evidentemente que estou de acordo com o Luís M. Jorge: não eram precisas «as escutas» para ver o óbvio. O óbvio é o óbvio — vem todos os dias nos jornais e basta fazer uma leitura da propaganda dos últimos três anos para o perceber. Não é preciso invocar conspirações extraordinárias; o puzzle está ao alcance de qualquer um e até do embaraço dos apaniguados. O argumento de que o país votou assim e que não se pode fazer nada contra isso não me comove extraordinariamente. Transformá-lo em república de juristas, debulhando o segredo de justiça (que flutua bastante, basta lembrar), discutindo pequenas censuras, e as conveniências de advogados e defensores da ordem, é o pior que nos pode acontecer. O problema do país não é jurídico nem legal — é político. Não é preciso ler o Sol nem as decepcionantes defesas oficiosas do regime, e do centrão, para o perceber. Desde há três anos que o problema é mais vasto. É a indiferença do país (tanto em relação ao endividamento externo de 177 mil milhões, como à propaganda e à mistificação, como a questões elementares de direitos e liberdades); a impunidade do poder e do Estado; o carácter manhoso da corte que Sócrates espalhou por uma rede influente e distribuída pelo Estado e pelas corporações; a rede de interesses e compromissos que junta negócios, influência na imprensa e decisão política; um PSD pouco empenhado e, sobretudo, pouco hábil que espera que Sócrates caia de maduro. A gritaria não vai poupar ninguém.
[FJV]

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Raciocínios não jurídicos


Numa sociedade democrática, as escutas telefónicas não só são monopólio do Estado, como são um monopólio extremamente regulado. No nosso país, por exemplo, vigora um princípio geral constitucional de proibição de ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações, salvo os casos previstos em leis respeitantes à investigação criminal.

E na investigação criminal, as escutas telefónicas só são autorizadas quando se investigam crimes puníveis com penas superiores a três anos de prisão e, não sendo um meio de prova proibido, deverão sempre ser consideradas um meio de prova excepcional. Em rigor, deveriam ser um último recurso da investigação, quando não fosse mesmo possível recolher prova de outra forma e houvessem sérios indícios de que a intercepção iria produzir frutos.

As escutas telefónicas desnudam-nos. E só nos devemos desnudar voluntariamente. Ponto final.

Infelizmente, no nosso país, como é frequentemente referido em público, tem havido um recurso cada vez maior e mais facilitado às escutas telefónicas, usando-se este método de investigação criminal mais como uma rede de pesca do que como um arpão. Com o risco de se adoptar o princípio de que tudo o que vem à rede é peixe ...

E daí que sejam lógicas e susceptíveis de serem subscritas por qualquer pessoa de boa fé, posições de princípio tais como as que se cristalizam na afirmação de que “as escutas ou têm relevância criminal (foi para isso que elas foram autorizadas) ou não têm qualquer relevância”.

E, não há dúvida, de que o poder judicial, a quem são confiadas as escutas telefónicas, tem um particular dever de respeitar e guardar a confidencialidade e o sigilo das escutas efectuadas, como tem o dever de assegurar o segredo de justiça.

Suponha-se, agora, que não o faz. Que as escutas telefónicas ou peças processuais em segredo de justiça são transportadas para fora dos espaços onde são supostas estar. Suponha-se, ainda que essas escutas revelam conversas que, não sendo criminais, são graves. Graves e relevantes politicamente, socialmente, humanamente. Tendo em conta as pessoas envolvidas, os temas discutidos ou as acções realizadas. O que fazer com tal informação?

O problema do acesso à informação coloca-se, hoje em dia, com particular acuidade nas sociedades democráticas já que, não obstante o acesso estar muito facilitado e generalizado, a complexidade do sistema do poder politico e económico permite a utilização de “cortinas de fumo”, biombos e outros artifícios que impedem o cidadão comum de saber minimamente o que se está a passar ou o que se passou.

Para além daquilo a que infelizmente podemos chamar o “folclore democrático”, que facilmente chega a todos, sob as mais variadas formas e feitios, há um vastíssimo número de negócios e negociatas, arranjos e arranjinhos, vergonhas e pouca-vergonhas que escapam a todos nós, contribuintes, eleitores e cidadãos. E, são, muitas vezes, estas realidades ocultas que determinam mil e um acontecimentos relevantes para a nossa existência. Pode dizer-se, e certamente com razão, que o exercício do poder politico e económico sempre terá sido assim. Sempre terão havido “manobras de bastidor” e “jogos de sombra”, sendo que ao “pagode” basta dar o pão e o circo.

Mas a democracia tem este “pequeno” problema: todos somos legitimamente interessados no exercício do poder pelos eleitos. Fomos nós que os colocámos lá. Ou que não conseguimos evitar que lá fossem colocados. Aquilo que eles fazem, salvo naturalmente o que respeita à sua vida privada, diz-nos directamente respeito.

Mas voltando às escutas. Suponha-se que estas carregam em si o pecado original: constituem uma violação da privacidade, realizadas com o fim de revelar a prática de crimes, mas foram desviadas desse fim, revelando-nos uma realidade bem diferente da que nos foi apresentada pelo poder? E não falamos das corriqueiras mentiras dos políticos e do poder, das promessas não cumpridas, dos pequenos fretes e favores, do triste e vulgar mercado de consciências. Falamos de conversas que indiciam manipulações de larga escala, recorrendo a meios e a dinheiros públicos, com vista a perpetuar o poder dos políticos que se sentam nas cadeiras do dito cujo.

Nada que se aproxime do crime de atentado contra o Estado de Direito praticado por titulares de cargos políticos, figura criminal, aliás, de absoluta inutilidade pela vagueza dos conceitos que utiliza. Mas que indiciam um ambiente malsão, mostrando que nos corredores do poder circula gente a quem não convidaríamos para jantar em nossa casa, apesar de terem dinheiro para jantar diariamente nos melhores restaurantes.

Seria tal informação publicável? A questão pode ( e deve) pôr-se em termos individuais e não jurídicos: se qualquer um de nós recebesse um CD com gravações de conversas chocantes, não sobre a vida íntima da vizinha, mas sobre comportamentos e actuações duvidosos daqueles que elegemos e nos governam, ou daqueles que, não tendo sido eleitos, ocupam cargos dominantes na sociedade, destruiria o CD ou procuraria divulgar o que se passava nas nossas costas?

Mesmo sabendo que corria o risco de ser responsabilizado criminalmente por divulgar aquilo que a lei, abstractamente, proíbe, o que lhe imporia a sua consciência?

É certo que o interesse público não se confunde com um qualquer interesse do público, mas não é menos certo que são as leis que servem as sociedades e não as sociedades que servem as leis. Ou quem as faz (Público de 13/02/10).

[FTM]

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Não aprender grande coisa

Um grupo generoso e ambidextro de apoiantes do primeiro-ministro prepara uma manifestação de desagravo ao líder, e que constitua “um aviso para a comunicação social”. Salvo erro, quem corre atrás “da comunicação social” acaba a levar pedradas. A lição não é de hoje nem de ontem. Até porque, como se sabe, o governo e as redações do jornais devem produzir coisas diferentes. O ideal é que “a comunicação social” do governo, e integralmente paga por ele, com o nosso dinheiro, se reduza ao circunspecto Diário da República. O desagravo tem toda a legitimidade; já “o aviso” é totalmente despropositado – limita-se a ser uma ameaça vulgar e malcriada, armada até aos dentes com a invocação do nome do líder. Coisas destas já aconteceram e as consequências foram risíveis.
[FJV]

Sondagem

Nova sondagem na coluna da direita.

Tauromaquia

O ataque mais frontal ao governo é o de Henrique Granadeiro; qualquer análise textual que explorasse a declaração do chairman da PT até às últimas consequências deitaria por terra a tese do «não é nada, é tudo invenção».
[FJV]

Joe, Joe

Há sempre alguém que, com descaramento, resume o essencial: «O Governo não pode ter uma ‘golden share’, mas um acionista pode.»
[FJV]

Guerra é guerra.

Guerra é guerra. Nesse cenário, a oposição gostaria de ter encostado José Sócrates à parede — e de ter o PS como aliado moral para se desfazer do primeiro-ministro. Um favor destes teria um preço enorme, sobretudo para a oposição que quer estar na salinha-de-espera aguardando mais negócios e colocações, como tem sido costume. Essa ideia, certamente generosa, encontra alguns senões, sendo o principal o facto de José Sócrates ser um lutador que vende cara a derrota, se é que a vende. Por isso, toda a gente caiu em cima dos socialistas que desafiaram a oposição para uma moção de censura; não percebo porquê.
Também aqui.
[FJV]

Sem condições


Este PS não é o PS da Fonte Luminosa mas um PS anémico e obediente que se deixou anestesiar pelo poder.


Um pouco por toda a direita chovem elogios ao PS. De um dia para o outro, um partido que tem dado as mais variadas provas da sua irrelevância política parece ter-se transformado no último garante da liberdade em Portugal. Não há quem não invoque o seu passado glorioso e o seu papel histórico na consolidação da democracia, na esperança de que, algures entre os escombros do largo do Rato, se encontrem ainda alguns socialistas, com memória, capazes de correr com o engº Sócrates e com o seu intolerável grupinho.
Infelizmente, tudo indica que este agradável cenário – que teria a superior vantagem de remover o actual primeiro-ministro sem que a Oposição fosse a votos – é, para dizer o mínimo, difícil de concretizar. É verdade que perante o descalabro em curso o PS murmura umas queixas, faz umas críticas baixinho e discute, já em público, a sucessão do chefe. O clima no interior do partido não se recomenda, como é óbvio. Mas, por muito que isso custe a alguns patriotas, os partidos não vivem do passado mas do presente. E este PS, que por aí ciranda desorientado, não é o PS da Fonte Luminosa mas um PS anémico e obediente que, durante cinco anos, se deixou anestesiar pelo poder. Em última análise, é uma consequência da liderança do engº Sócrates do qual não se pode agora dissociar.
A tese, defendida pela Oposição, de que cabe ao PS, a bem dos superiores interesses do país, desembaraçar-se do seu próprio líder, revela, apenas, a impotência dessa mesma Oposição. Dando de barato que o engº Sócrates não tem condições para se manter como primeiro-ministro, seria de esperar que Oposição agisse em conformidade e avançasse com uma moção de censura. Em vez disso, a Oposição confessa que a alternativa ao actual primeiro-ministro não passa por ela mas sim pelo PS, que, de acordo com a sua tese, tem a obrigação de desencantar um substituto de última hora já que os outros partidos não têm qualquer alternativa a apresentar. E assim chegamos ao fundo de um poço que parece não ter fundo: o primeiro-ministro não tem condições para governar; a Oposição não tem condições para ir a eleições; o Presidente da República não tem condições para demitir o primeiro-ministro. E o país assiste, estupefacto, à crescente degradação do regime sem que ninguém tenha condições para travar a hecatombe que por aí se avizinha. Talvez seja a altura de se perceber finalmente que não podemos continuar a viver sem condições.
No Correio da Manhã.
[CCS]

Liberdade, etc.

A questão não é a falta de liberdade de expressão; nessa matéria, Portugal não pode voltar atrás, independentemente de alguns saltos nos índices internacionais de liberdade de imprensa (nos quais estamos atualmente na 33.ª posição, o que significa uma descida da 19.ª, que ocupávamos em 2008, ou da 10.ª, onde estávamos em 2007). A questão é a tentação de a limitar sob pretextos comuns ou absurdos. Isto tanto é válido para a falta de jeito de Gomes da Silva no governo de Santana (e da sua central de informação), como para o discurso chavista de José Sócrates no congresso do PS de há um ano.

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Conheci vários políticos que encaravam a imprensa com largueza e bonomia (até reconhecendo que a bonomia era uma forma de seduzi-la). Confesso, até, que isto era mais comum à esquerda do que à direita. Vi várias vezes João Soares, por exemplo, encarar jornalistas desafetos ou bastante críticos — com piadas e diálogos frontais. Marcelo Rebelo de Sousa, à direita, era outro dos exemplos. Isto explica-se, facilmente, pelo facto de muitos políticos terem vindo do jornalismo ou por terem passado, de alguma forma, pelas redações dos jornais. Mas não me recordo de um confronto tão desajustado entre os políticos e a imprensa como nos tempos de Santana e de Sócrates. Para os que correm a mencionar o período de Cavaco, relembro que não há queixas sobre pressões de Cavaco Silva sobre a imprensa; O Independente fazia o seu trabalho, Belém fazia o seu (que mereceu uma interessante tese de Estrela Serrano que muita gente devia ler), e S. Bento cumpria as suas obrigações. Cada um sabia qual era o seu território.

Uma nova geração de políticos já não entendia que governar era apenas governar, cumprir o seu papel institucional, fazer escolhas que também podiam ser criticadas, exercer o seu poder no quadro dos vários poderes — era muito mais. Era ser ungido. Essa geração entende que governar é mais do que isso: interpretam uma missão. São «modernos» num país atrasado; «cosmopolitas» num país que vai aos saldos da Zara; visitaram as cortes europeias e ficaram impressionados. Não querem saber de pormenores. O país tem de andar para a frente e o pequeno «mundo» que as suas funções políticas lhes permitiu conhecer entre aeroportos, salões de hotel e reuniões com gente que tem sempre o nome nos jornais, era o retrato que gostariam de trazer para a Pátria. Não, não são apenas governantes. São mais do que isso — são reformadores de costumes, que querem mudar por decreto; são modernizadores da economia, que apreciam no contacto com os grandes empresários a quem facilitam negócios. O resto é um empecilho.

Por isso, qualquer crítica a um simples decreto-lei constitui parte de um ataque mais geral à sua missão, às grandes ideias (que talvez não tenham, mas que alguém serve de bandeja e em resumo), ao papel de modernizador da sociedade, ao lugar que hão-de ocupar na História. Isto tem consequências mentais trágicas. Porque um ataque, um insulto, uma injustiça, um rumor, uma catilinária ocasional, uma crítica, um reparo — não são apenas ao seu governo. Porque as suas ideias (as tais), a sua missão, o seu cosmopolitismo, a sua fúria patriótica estão também relacionadas com a sua roupa, o design da casa, o penteado, o tom de voz (pedagógico, superior, explicativo), os restaurantes que se frequentam. E o que era um ataque à sua política passa, pelo protagonismo que desempenham e que os há-de fixar numa página da História, a ser um ataque pessoal, uma amostra de maledicência, uma prova de má-fé. E, acima de tudo, ou mais profundamente, a prova de que não compreendem o indiscutível talento, uma clarividência histórica, uma generosidade a toda a prova. A imprensa está cheia dessa gente que não manifesta nenhuma compreensão; os blogues (que até o sr. Procurador-geral diz que são uma vergonha) estão cheios de invejosos que não reconhecem a sua altíssima presciência. O que isto significa? Sinceramente, falta de mundo. Mário Soares resistia a todas as críticas (mesmo que se diga que nunca as esquece); porque lhe sobrava mundo; tinha uma vida própria — e biblioteca, e apetites, e vícios amáveis, e amigos — que ultrapassava a vida pública. Cavaco compensava a falta de mundo com a disciplina pessoal e familiar. Mas os políticos para quem toda a vida pessoal foi ocupada em transformar a vida própria em vida pública não têm largueza de sensibilidade, nem escape, nem compensações. O seu rosto é o verdadeiro espelho da alma; não aprenderam a dissimular mais do que lhes ensinam os técnicos de comunicação e a intuição que vem dos combates dentro do aparelho. Qualquer obstáculo — ou crítica, injustiça, reparo — é uma tragédia. Eles, os outros, os pobres de espírito e maledicentes que não compreendem, servem-se da liberdade para a maledicência e o ataque sem fronteiras.

Esses políticos não sabem, simplesmente, que o lugar na História não é decidido agora. Não aprenderam, também, que o poder tem um preço — e que esse preço não é apenas pessoal (porque se sacrifica muito desse espaço pessoal, privado, inviolável); é também público. Exige grandeza para suportar críticas e injustiças. Até injustiças. O poder tem os seus meios institucionais de comunicar, defender, explicar; a imprensa é, justamente, o outro lado. Não se pode estar nos dois lados ao mesmo tempo. E isto é tão válido para um governante como para um jornalista. O poder oferece um mundo de possibilidades, a começar pela direção editorial do Diário da República; se essas não chegam, aí já é um problema mais grave. Há terapias para isso.

[FJV] Também aqui.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

«Uma história de amor»

«O caso das escutas dividiu o país em duas metades. A primeira, obviamente cínica, proclama por aí que Portugal não é um país civilizado. Se fosse um país civilizado, o primeiro-ministro já estaria na rua e o PS, a oposição ou até o Presidente da República já teriam encontrado um novo chefe.
Aos cínicos, respondem os românticos: o ‘Sol’ até pode revelar que a compra da TVI pela PT era o primeiro passo para controlar a comunicação social a favor do governo. Um ‘polvo’, no fundo. Mas isso não prova necessariamente que o governo sabia do arranjo. Para os românticos, a única parte que não sabia de nada era a parte que mais beneficiava com o todo.
Perante este sublime paradoxo, resta-nos concluir que os rapazes da PT actuaram por puro amor ao chefe; e que tencionavam, para infinita surpresa deste, oferecer-lhe os órgãos de comunicação social no sapatinho, de preferência com embrulho natalício a condizer.
Razão tem Henrique Granadeiro, o presidente da PT que se sentiu ‘encornado’ com tanta paixão. Nesta história de amor, afinal havia outro.»

[JPC, Correio da Manhã, 14/2/2010]

Sugestões


Ainda haverá uma tradição literária ocidental? Anthony O'Hear, actual director do Royal Institute of Philosophy, de Londres, responde que sim. Em Os Grandes Livros (Alethêia), O'Hear revisita essa tradição (desde Homero) e termina no Fausto de Goethe. Um prodígio de interpretação filosófica que teve como ponto de partida o seminário do mesmo nome que O'Hear trouxe ao Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa, em 2004. [JPC]

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Sugestões



Os livros circulam nas livrarias a uma enorme velocidade. Tirando os best-sellers e outras obras mais procuradas, a maior parte das obras publicadas desaparecem da nossa vista num período muito curto de tempo.
O que acontece é que, muitas vezes, nem temos tempo de nos apercebermos do que vai sendo publicado. Só especialistas ou frequentadores frequentes de livrarias, podem saber sempre o que saiu.
Felizmente existem os alfarrabistas. Em Lisboa, é um prazer pela manhã, num sábado de sol, poder percorrer a feira de alfarrabistas da Rua Anchieta no Chiado.
Para além do inevitável prazer da descoberta e do sol, é sempre possível juntar o útil ao agradável.
Há pouco tempo foi publicitado um acórdão de 12 de Março de 2009 do Tribunal da Relação do Porto que reconhecia o direito às duas viúvas de um bígamo o direito a partilharem a herança por sua morte. O falecido casara em 12 de Julho de 1985, na Venezuela com a Joana, tendo tido um filho e, em Portugal, casara catolicamente com Fernanda em Julho de 1994. Morrera em Novembro de 1996 e já tinha sido ultrapassado o prazo para anular o 2.º casamento pelo que as duas viúvas foram consideradas herdeiras conjuntamente com o filho da Joana.
A ida à feira dos alfarrabistas permitiu-me encontrar o livro " A Bigamia em Portugal na Época Moderna" de Isabel Mendes Drunond Braga que dá uma perspectiva histórica da perseguição deste crime, sublinhando o papel da Inquisição na sua repressão. Sobre o casamento : " O casamento cristão foi uma invenção medieval, tornando-se corrente, no século XIII, os casais fazerem-se unir por um sacerdote. Passou-se de uma cerimónia privada a que a Igreja se começou por associar discretamente para a imposição de um sacramento. O clero foi ganhando importânica na medida em que não se limitava a testemunhar a celebração mas outorgava a benção aos nubentes".
Para além dos mil e um livros que pode ver, tocar e comprar, na feira dos alfarrabistas, também vai encontrar uma requintada sobremesa : as bancas dos postais antigos. Uma festa para os olhos e para a mente.
[FTM]

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

«A resposta de Cavaco»

«Cavaco Silva tem inteira razão: existe nervosismo a mais na Assembleia e em S. Bento. Mas o Presidente não deve olhar apenas para um dos lados. Existe o outro lado, onde estão os portugueses comuns: gente que lê, entre o pasmo e o horror, as escutas publicadas pelo ‘Sol’. Discutir a legalidade da publicação das mesmas é interessante. Mas esse debate não altera a fatalidade política de as conhecermos. No fundo, de conhecermos um plano que envolve o governo para controlar a comunicação social, limitar a liberdade de expressão e até condicionar a actuação do Presidente.
Claro que, para 2010, este não era o prato que Cavaco esperava encontrar: com os mercados internacionais de olho na paróquia e uma recandidatura a Belém no horizonte, a realidade é indigesta.
Infelizmente, há coisas mais indigestas do que a realidade: a negação dela, ou seja, a negação de que há sinais de que o regime apodrece. A pergunta é inevitável: o Presidente confia ainda neste primeiro-ministro? A resposta será também uma avaliação do seu legado.»

[JPC, Correio da Manhã, 7/2/2010]

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

«A histeria»

«Parece que o dr. Paulo Rangel vai denunciar no Parlamento Europeu a falta de liberdade de expressão que, segundo ele, existe em Portugal. Confesso que me custa a perceber qual é o alcance desta nobre iniciativa: promover uma comissão internacional para averiguar a saúde da nossa democracia? Não faço ideia. Mas este simples facto revela, por si só, a histeria que tomou conta do País, nos últimos dias.
O célebre artigo de Mário Crespo sobre uma conversa ouvida, num restaurante, entre o primeiro-ministro e um "executivo de televisão" já tinha dado um sinal disso mesmo. A indignação generalizada que acompanhou esta nova vítima da "asfixia democrática" só se compreende se deixarmos de compreender tudo o resto: a história é fidedigna? Mário Crespo, com base num mail que lhe foi enviado por alguém que estava numa mesa ao lado, afiança que sim; Nuno Santos, o tal "executivo de televisão" que serviu de interlocutor ao primeiro-ministro, garante que a conversa não decorreu da forma como foi descrita. Supondo que sim – o que é supor muito, diga-se de passagem – é difícil compreender como é que uma conversa privada sobre Mário Crespo se transforma num artigo público do mesmo Mário Crespo.
É evidente que há quem diga que o local era público – o que leva a crer que não pode haver conversas privadas em locais públicos. Curiosamente, os que dizem isso, agora, são os mesmos que, não há muito tempo, consideraram (e bem) que a publicação de um mail privado de um jornalista do ‘Público’, no ‘Diário de Notícias’, era, no mínimo, inaceitável. Uma curiosa evolução que mostra como a opinião, em Portugal, se deixou barricar entre os que são contra o eng. Sócrates (e usam tudo para o atacar) e os que o defendem a todo o custo (e usam tudo para o justificar).
É evidente, como dizem alguns, que sem Sócrates não havia Mários Crespos – basta ver, aliás, a quantidade de Mários Crespos que pululam, por aí, à conta de um primeiro-ministro que nunca soube lidar com a Comunicação Social. Mas se a liberdade de expressão está, de facto, em causa, não se percebe porque é que a Oposição, nomeadamente, o PSD do dr. Rangel, não tira daí as devidas consequências e apresenta uma moção de censura na Assembleia da República. Ou, melhor, percebe-se: porque a Oposição sabe que, por pior que seja o eng. Sócrates, não existe qualquer alternativa ao seu famigerado Governo. Daí que apelar ao Presidente da República para que demita o primeiro-ministro, na situação em que o País se encontra, seja um exercício fútil que dificilmente pode ser levado a sério. Ou seja mais um sinal da histeria que por aí abunda.»

[CCS, Correio da Manhã, 9/2/2010]

Sugestões


Woody Allen. O homem é realizador. Actor. Argumentista. Dramaturgo. Escritor. Músico. E também personagem de banda desenhada entre 1976 e 1984. Stuart Hample, o autor, explica a aventura aqui.
[JPC]

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Sociedade civil







O Contraditório é uma associação, recém-nascida, "sem fins lucrativos, independente e sem qualquer vínculo político-partidário que tem como missão divulgar boas práticas e propor soluções inovadoras".
Parece salutar começar, desde já, a acompanhar os seus trabalhos, destacando-se, nesta fase, o debate em que pode participar, entre Pedro Miranda e José Delgado Domingos sobre a existência ou não de bases científicas sólidas para a necessidade de calendarização da redução das emissões de gases de estufa.
[FTM]

Sugestões

"Music to change life - El Sistema" de 2009, é um documentário emocionante sobre a história e o desenvolvimento do projecto de António José Abreu que, na Venezuela, permitiu que muitos milhares de crianças ao longo de dezenas de anos tenham descoberto na música uma vida diferente daquela a que estavam condenados.
O lado mais visível deste excelente trabalho é a Orquestra Simon Bolívar dirigida por Gustavo Dudamel mas os núcleos espalhados pelos bairros populares são o lado mais importante desta lição artística e humana.
Por cá, baseado no "El Sistema", temos o projecto Orquestra Geração que há 3 anos vem dando os primeiros passos e que se espera venha a crescer depressa e bem. Com repertório nacional, espera-se !

São dezoito contos de José Eduardo Agualusa, uns maiores, outros menores, mas todos eles nos trazem o prazer de nos obrigarem a percorrer universos portugueses, angolanos ou brasileiros, sábios e bem construídos. Como se refere na contracapa, são " contos de um mundo que fala português".
[FTM]

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O clássico argumento das prioridades


Obama decidiu pôr termo ao banimento legal dos homossexuais nas Forças Armadas norte-americanas.
O Almirante Mullen e o Secretário da Defesa Robert Gates, de uma forma consistente e inequívoca, apoiaram a decisão de Obama mas houve quem não concordasse.Transcreve-se por exemplo:
“Num momento de recessão e de uma potencial crise de emprego de longa duração, uma guerra com duas frentes e uma ameaça à segurança nacional, em curso, de radicais islâmicos que iriam adorar ver um avião cheio de americanos ser bombardeado em pedacinhos, duvido que uma das principais prioridades nas mentes da maioria dos americanos seja promover a homossexualidade aberta nas nossas forças armadas. E, no entanto, esse é o caminho que o presidente Barack Obama – e aparentemente, alguns dos seus bajuladores conselheiros militares - por si escolhidos". (FTM)

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Sugestões


(1) Finalmente, Darrin McMahon é publicado em Portugal. Pelas Edições 70, como sempre. Intitula-se Uma História da Felicidade e é, como o título indica, uma cartografia da dita: do fatalismo dos Gregos ao racionalismo dos contemporâneos.
(2) Elizabeth Gaskell, contemporânea de Jane Austen, é prosadora esquecida. Injusto. Em Cranford, premiadíssima série da BBC baseada nas obras de Gaskell, encontramos o retrato subtil de uma pequena comunidade rural onde o confronto entre a tradição e a modernidade domina as vidas, as conversas, os comportamentos e os temores da população nativa. Um luxo.
[JPC]


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

À busca do acórdão perdido

“... a verdade é que as lojas maçónicas, incluindo o Supremo Tribunal Administrativo e a Relação de Lisboa, deixaram-se infiltrar pelo jesuitismo e profanos de avental, que constituíram uma máfia que opera nos tribunais portugueses — um grupo de indivíduos incluindo juízes, magistrados do Ministério Público, ministros (da Justiça e de outras pastas), advogados, banqueiros, empresários, embaixadores, autarcas, homens do teatro, do cinema e da televisão — que distribuem sentenças entre si em benefício dos seus irmãos”.

Estas insólitas afirmações constam das alegações de um recurso apresentado no Supremo Tribunal Administrativo (STA) em que o recorrente pretendia ver declarada a nulidade da decisão que lhe aplicara a pena de aposentação compulsiva por entender que os juízes autores dessa decisão “são membros da Máfia dos Tribunais Portugueses” pelo que “não constituem um verdadeiro tribunal”.

O STA negou provimento ao recurso tendo em conta que “os Juízes que intervieram na decisão em causa foram nomeados pela entidade competente e de acordo com o quadro legal aplicável”. E o acórdão do STA foi publicado na base de dados www.dgsi.pt disponibilizada pelo Instituto de Tecnologias de Informação na Justiça (ITIJ) onde ficou ao dispor de todos os juristas e interessados.

Até aqui, para além do insólito e violento conteúdo das alegações, nada de especial haveria a referir. O que é grave vem a seguir e levanta uma questão que já há muito é colocada pelos juristas e deve ser colocada por todos os cidadãos.

Sucede que dias depois de ter sido disponibilizado na referida base de dados, o acórdão desapareceu da mesma, deixando de estar acessível aos portugueses, reservado a não se sabe bem a quem, porque quem tentava lá chegar, nada mais via do que uma página em branco e era-lhe pedida uma password ! Fantástico, não é ?

Mas, graças a Deus, muitas vezes a internet está um passo à frente dos detentores do poder, sejam eles chineses ou portugueses. O Google faz “fotografias” de todas as páginas que vão surgindo e guarda-as em “cache” e, assim, o acórdão continuou a poder ser consultado embora fora da página da base de dados oficial..

Entretanto, segundo apurei, já um anterior acórdão do STA sobre o mesmo assunto havia estado disponível na base de dados do Ministério da Justiça e tinha, posteriormente, sido retirado. A gravidade da questão é por demais evidente e já foi abordada, por outro prisma, num artigo de José Manuel Meirim publicado neste jornal em 28 de Março do ano passado, de que transcrevemos um excerto: “ Com o surgir das bases de dados públicas e de acesso gratuito e universal via internet – não curamos agora das suas deficiências -, o endereço electrónico www.dgsi.pt passou a constar necessariamente do léxico do jurista. Sucede, no entanto, que no âmbito das decisões de ordem judicial (Supremo Tribunal de Justiça e Tribunais da Relação), o número de acórdãos disponibilizados se fica por cerca de um quarto da totalidade dos que são efectivamente proferidos. Tal pressupõe uma selecção cujos critérios não se nos apresentam seguros, sem contar com a natural subjectividade de quem leva a efeito essa tarefa”.

Na verdade, a selecção dos acórdãos que passam a estar disponíveis não obedece a critérios publicitados e escrutináveis e, parece ocioso lembrar que, nas nossas sociedades, o saber é poder...

Um juiz desembargador relatou-me, há dias, , uma situação que ilustra bem um dos problemas causados por esta situação: num determinado processo, tinha proferido uma decisão em 1ª instância que o Tribunal da Relação, em recurso, decidira em sentido contrário, tendo esta decisão sido publicitada. Contudo, o processo chegou ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ), que revogou a decisão do Tribunal da Relação, confirmando a decisão da 1.ª instância, mas este acórdão do STJ não foi publicitado, pelo que quem estudasse o assunto, provavelmente, conformar-se-ia com o entendimento do Tribunal da Relação. Mas para além desta situação, muitas outras se podem configurar, como, por exemplo, a da não divulgação de acórdãos com votos de vencido cerceando o livre debate de teses jurídicas (de momento) não maioritárias.

Segundo me foi referido, a razão para não serem introduzidos na base de dados informática, todos ou quase todos os acórdãos, será a falta de verbas por parte do Ministério da Justiça para pagar a quem faça tal trabalho. Uma razão que me parece que deve ser rapidamente ultrapassada. Mas convenhamos que tal justificação é um pouco incongruente: se não há dinheiro para pagar a juristas/informáticos para colocar os acórdão na base de dados, como é que há dinheiro para lhes pagar para retirarem acórdãos da mesma base de dados ?Mas sobretudo como é possível admitir-se que se censurem decisões de órgãos de soberania e que se possa considerar as mesmas como só acessíveis a alguns portugueses?

Entretanto, ontem e anteontem, diligenciámos junto do ministério da Justiça para apurar da responsabilidade desta decisão censória. Em boa hora o fizemos: ficámos a saber que a decisão tinha sido do próprio Supremo Tribunal Administrativo e que , oficialmente, destinar-se-ia a verificar se o que estava publicado correspondia ao que estava no processo (!). Certo é que, ontem ao fim da manhã, os acórdãos em causa voltaram a estar disponibilizados na base de dados do ITIJ. A censura já não é o que era ... (Público de 30/01/10)

[FTM]

«Pessoas e fantasmas»

«Uma amiga dizia-me há tempos que a burqa tem as suas vantagens. "Há dias em que acordamos maldispostas e não temos vontade para arranjar o cabelo ou usar maquilhagem." Enfiar um trapo medieval, da cabeça aos pés, seria um descanso para muitas. E, convém lembrar, um direito: se uma mulher se decide enfaixar livremente, por que motivo devemos proibir o gesto?
Resposta: não devemos. E a lei que a França prepara sobre a matéria não pretende essa abolição total. Se as mulheres usam burqa em casa, nas ruas, nos jardins – problema delas. Mas se usam burqa nos hospitais, nos serviços públicos, nos transportes – problema de todos.
Em sociedade, o nosso respeitável solipsismo termina quando entramos em interacção com terceiros. O que implica uma capacidade de reconhecimento mútuo: de olhar para o rosto de um estranho, divisando-lhe expressões ou intenções. Esse reconhecimento é um imperativo de comunicação e confiança. Mas é sobretudo uma condição de civilidade: a civilidade que faz das sociedades ocidentais aglomerações de pessoas, e não de fantasmas.»

[JPC, Correio da Manhã, 31/1/2010]