quarta-feira, 31 de março de 2010

Sugestões


Já tinha saudades de Isabelle Adjani. Já tinha saudades de Isabelle Adjani em filme competente sobre professora de liceu que sequestra a turma em momento psíquico e existencial de não-retorno. Numa altura em que Portugal fala da indisciplina escolar, O Dia da Saia talvez sirva de aviso.
[JPC]
P.S. - Na Folha, escrevi texto longo sobre o filme. Para os interessados, follow me.

Sugestões


Esta Páscoa não perca todo o seu tempo a ler livros existencialistas. É certo que é sempre bom procurar um sentido para a vida e mesmo encontrá-lo mas também é muito agradável vivê-la sem nenhum sentido. Ou melhor, com um ligeiro sentido musical...
Pode escolher ou acumular: os 4 cd's de Yehudi Menuhin & Stéphane Grappelli são uma edição em promoção, à venda em qualquer loja de discos perto de si, com dezenas de memoráveis adaptações e arranjos musicais.
Já o disco "Evelyn Evelyn" é uma obra que, para já, terá de encomendar no site oficial destas gémeas fictícias que nos trazem uma divertida história e festa musical cheia de humor (negro) e alegria (roxa). Poderá não ser Santa mas será, concerteza, uma Excelente Páscoa...
[FTM]

segunda-feira, 29 de março de 2010

«A receita»

«Esperava uma vitória de Pedro Passos Coelho. Não esperava uma vitória tão folgada. Existem diferenças. Com uma vitória modesta, Passos Coelho teria vários abutres a pairar sobre a sua carcaça. Com uma vitória folgada, Passos Coelho não se limitou a espantar as aves. Ele enfiou-as na gaiola para os próximos tempos: Marcelo continuará na universidade (e no comentário) até às presidenciais de 2016; Rangel rumará para Bruxelas; e Rio ficará no Porto, descendo à capital apenas se a liderança de Passos Coelho falhar. E, para falhar, basta que o novo líder repita os erros do consulado anterior, afastando inimigos internos e diabolizando os externos.
Se afastar os inimigos internos, Passos Coelho fará com os outros o que Ferreira Leite fez com ele: uma espécie de nobilitação à dissidência. E se apostar no atrito político para derrubar Sócrates, o novo PSD estará a fazer um favor ao velho PS. Porque será a economia, e não a política, a selar o destino do primeiro-ministro.
Esperar sem se comprometer podia não ser a receita do ‘jovem’ Passos Coelho. Resta saber se o ‘jovem’, entretanto, vai crescer.»

[JPC, Correio da Manhã, 28/3/2010]

quarta-feira, 24 de março de 2010

Google v. China

A Google decidiu acabar com o "casamento de conveniência" com as autoridades chinesas que permitia a censura das buscas feitas através do Google China. A partir de agora, as buscas são redireccionadas para o site da Google em Hong-Kong sem censuras.
Claro que as autoridades chinesas podem bloquear o acesso a esse site e, por isso mesmo, a Google criou uma página com um gráfico onde se pode acompanhar diariamente o tipo de dificuldades criados pelas autoridades chinesas no acesso a diverso tipo de serviços.
É uma decisão que indiscutivelmente se deve aplaudir, independentemente de poder, também, ter sido influenciada pelos resultados menos brilhantes que a Google tem tido no mercado chinês.
PS. Na nossa tradição portuguesa, nunca podemos dizer bem de nada nem de ninguém, sem logo referir uma qualquer mácula, mesmo que de um passado longínquo, do elogiado ...
[FTM]

terça-feira, 23 de março de 2010

«Três saídas»

«O PS faz lembrar aquelas famílias onde não há pão e todos protestam sem ninguém ter razão. Que nos diz a ala esquerda do partido? Diz-nos que Sócrates se transformou num terrível ogre de direita, disposto a cortar prestações sociais e a atraiçoar o legado do PS. Só faltava mesmo acrescentar que esse legado conduziu o País à situação de decadência económica que o PEC, coitado, não conseguirá evitar.
E não conseguirá evitar porque o documento é uma colecção de remendos para tapar o buraco das contas públicas. Sobe-se aqui (impostos), corta-se ali (subsídios vários), vende-se mais além (privatizações) e, nos intervalos, reza-se: para que a economia, que não cresceu em tempos de vacas gordas, desate agora a crescer no tempo das magras. No meio do circo, não existe uma única ideia consequente sobre a necessidade de redimensionar um Estado que consome de mais, faz de menos e gasta o que não pode.
Como diria um conhecido economista brasileiro, os portugueses de hoje têm três saídas: a liberalização do Estado; o Aeroporto da Portela; ou o Aeroporto Sá Carneiro. O resto é ruído.»

[JPC, Correio da Manhã, 20/3/2010]

domingo, 21 de março de 2010

Sugestões

"O Rolando tinha uns cinquenta anos e vivia há mais de trinta nos jazigos do cemitério de Avellaneda. Era por isso que quase ninguém o levava a sério. E mais ainda quando estava bêbedo. Eu, pelo contrário, pensava que as pessoas podem viver onde lhes apetecer".
"Estávamos no Verão, um ano depois do nascimento da minha maninha. Tinhamos juntado cerca de cem pesos para ir à Villa Mariel e estrear-nos com uma puta. Demorámos um mês a vender as rifas de um cabaz familiar a um peso cada uma, dizendo que precisávamos de dinheiro para comprar camisolas para nossa equipa".
Recomendam-se estas aventuras de um "puto" pobre argentino contadas pelo próprio...

[FTM]

terça-feira, 16 de março de 2010

O Congresso e a Rolha

Constituem deveres dos militantes do PSD, nos termos da alínea f) do n.º1 do artigo 7.º dos Estatutos , "ser leal ao Programa, Estatutos e directrizes do partido, bem como aos seus Regulamentos".
A violação deste dever por parte de um militante passou a ser considerada uma "infracção grave, especialmente quando a mesma se consubstanciar na oposição às directrizes do Partido no período de sessenta dias anterior à realização de actos eleitorais nos quais o PPD/PSD apresente ou apoie candidatura" e dará direito à suspensão do militante até dois anos ou à sua expulsão.
Esta alteração estatutária, apresentada ao XXXII Congresso Nacional por Pedro Santana Lopes, como sempre pouco crente no valor da liberdade de expressão, é lamentável e inútil. Mas não é estalinista.
O seu a seu dono.
[FTM]

Sugestões

" A esplanada estava vazia. No restaurante, mais concorrido, vi Frau Else. Instalada numa mesa perto do balcão, dois homens de fato e gravata faziam-lhe companhia. Não sei porque é que pensei que um deles era o seu marido, ainda que a imagem que guardava dele em nada se parecesse com aquele. Tratava-se sem dúvida de uma reunião de negócios e não quis importunar. Também não desejava mostrar-me tímido e com este propósito aproximei-me do balcão e pedi uma cerveja. O empregado demorou mais de cinco minutos a servir-ma. A sua morosidade não obedecia ao excesso de trabalho, que até era pouco."
Ou ainda, "Jantámos no Costa Brava. Como era de prever, o jantar acabou por não ser animado. Frango com puré de batata e ovos estrelados, salada, café e gelados, que os empregados de mesa, a par do que estava a contecer (na realidade éramos o alvo de todos os olhares), nos serviram com uma afabilidade fora do comum. O nosso apetite não diminuiu".
Um permanente mal estar muito bem escrito...
[FTM]

segunda-feira, 15 de março de 2010

Sugestões



Será possível realizar um filme sobre a guerra do Iraque que não seja um filme sobre a guerra do Iraque? Afirmativo. Kathryn Bigelow conseguiu-o: uma obra de guerra e sobre a guerra sem as piedades panfletárias da praxe. Ganhou o óscar. Mereceu. O DVD já chegou a Portugal.
[JPC]

«Creche e aparece»

«Quantos dias terá o Congresso do PSD? Pessoalmente, o Congresso podia acabar poucas horas depois de começar. Com o discurso de Manuela Ferreira Leite. O que virá a seguir será com certeza babugem eleitoralista e inútil.
O discurso de Ferreira Leite, pelo contrário, foi simultaneamente triunfal e trágico. Triunfal, porque foi possível ver, talvez pela última vez, uma mulher sem carisma mediático a repetir o que hoje é consensual: o Estado caminha para a falência; os partidos estão em descrédito; o regime está atolhado em falsidades. Mas quem, há cinco meses, esteve interessado em ouvir este sermão?
O lado trágico está aqui: as eleições não se ganham com verdades; ganham-se com mentiras porque os portugueses preferem-nas. E se existiu erro no consulado de Ferreira Leite foi o de sobrevalorizar a maturidade dos portugueses; a crença ingénua de que era possível falar para adultos. Não é.
Para regressar ao poder, não basta ao PSD eleger um líder e esperar que o eng. Sócrates caia da cadeira. É preciso nivelar o discurso com a idade mental do eleitorado.»

[JPC, aqui]

sábado, 13 de março de 2010

Avisam-se as tropas...

... que o «Torto» vai ao Congresso. Se, evidentemente, ainda houver Congresso quando os quatro lá chegarem.

terça-feira, 9 de março de 2010

«Ausência de alternativa»

«Costuma-se dizer por aí que não é a Oposição que ganha as eleições mas sim o Governo que as perde. A fazer fé nesta tese, bastaria à Oposição ficar quieta e em sossego para que o poder, mais tarde ou mais cedo, lhe viesse parar docemente às mãos sem mérito, nem esforço e sem sombra de qualquer projecto alternativo. Numa situação destas, as eleições, como é óbvio, não seriam mais do que um expediente formal que legitimariam, com o voto, uma situação sem saída.
É verdade que, nos últimos tempos, as demissões extemporâneas do eng. Guterres e do dr. Durão Barroso vieram dar corpo a esta tese. Com os lindos resultados que se viram, diga-se de passagem. Mas estes dois exemplos – e, se quiserem o do prof. Cavaco Silva que decidiu não se recandidatar em 95 – não justificam, por si só, uma tese que assenta, antes de mais, num dado nem sempre adquirido que é a demissão do primeiro-ministro. Basta ver o resultado das últimas eleições legislativas para se perceber que as coisas não funcionam assim de forma tão simples: embora o PS tenha perdido a maioria absoluta e um número significativo de votos, o PSD não só não beneficiou disso como teve um dos piores resultados de sempre.
Porque o povo é estúpido, como afirma Vasco Graça Moura? Não, porque os eleitores, na sua maioria, não viram no PSD uma alternativa ao Governo do eng. Sócrates, nem se reconheceram na campanha eleitoral do partido – uma campanha de tal forma desastrada que, agora, tarde e a más horas, até o dr. Paulo Rangel, o presumível herdeiro da dra. Ferreira Leite, achou por bem distanciar-se da estratégia adoptada para as legislativas.
Neste sentido, a sondagem publicada, na semana passada, pelo ‘Público’, onde a maioria dos inquiridos considera que o eng. Sócrates mentiu ao Parlamento sem que isso os impeça de lhe dar uma maioria folgada nas legislativas, caso estas se realizassem agora, também dá que pensar. Porque o povo não é muito sensível à mentira? Porque acha que todos mentem? Porque não tem particular apreço pelo Parlamento e por tudo o que por lá se passa? Haverá de tudo isto um pouco. Mas basta olhar para a campanha interna do PSD para se perceber que o partido não é mais do que um poço de intrigas, dominado pelo aparelho e por meia dúzia de baronetes que se julgam imunes a toda e qualquer responsabilidade.
O resultado é um espectáculo penoso entre três candidatos que não se distinguem por uma ideia e se desdobram nas mais despropositadas propostas. Um partido assim não oferece garantias de nada e não é alternativa a coisa nenhuma.»

[CCS, Correio da Manhã]

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Descobrir um novo autor é a alegria suprema de qualquer cinéfilo. Aconteceu comigo. Aconteceu com Valerio Zurlini, um gigante do cinema italiano que não me tinha ainda passado pelo radar. Vejam Um Verão Violento (1959), A Rapariga da Mala (1961), Outono Escaldante (1972) e O Deserto dos Tártaros (1976). Nunca o dilema clássico do desejo e do dever conheceu tratamento igual. Meço as palavras.

[JPC]

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"Cede de boa vontade a honra que te é feita, de te sentares em primeiro lugar; convidado que és a tomar um lugar de maior distinção, dispensa-a de uma forma afável; se insistirem, por diversas vezes e com convicção, e se a pessoa que te fizer tal pedido desfrutar de alguma autoridade, aceita, mas com modéstia, resistir mais pareceria um sinal de obstinação, e não de educação."
Este, simpático e actual, manual de educação para a juventude foi publicado em 1530, sendo seu autor Desidério Erasmo de Roterdão.

Erasmo de Roterdão (1469-1536) foi, sem dúvida, a personalidade cultural europeia mais importante da sua época não só pela sua actuação em prol da reforma não-violenta dos costumes, religião e mentalidades da Europa, impulsionando-a sair das limitações da Idade Média e introduzindo-a na sabedoria livre e harmoniosa do Renascimento, como, sobretudo, pelos muitos livros que escreveu, traduziu, restabeleceu ou comentou e pela rede de contactos que dinamizou, seja nas suas inúmeras viagens pela Europa seja pela via epistolar, destacando-se entre os seus melhores amigos Thomas More, John Colet, John Fisher, Reuchlin, Budé, Dürer, Aldo Manúcio, Fröben e Damião de Góis.
A sua criatividade pedagógica resistiu à passagem do tempo e obras como o “Elogio da Loucura”, o “Modo de orar a Deus”, os “Adágios” e os “Colóquios”, continuam a ser apreciados, traduzidos e comentados. Algumas citações de Erasmo:
- Por muito que os antigos tenham dito,muito deixaram para ser dito pela posterioridade.
- Defendo a existência do menor número de leis possíveis, que sejam bem conhecidas de todos, e que respondam ao arquétipo da honestidade e da equidade, sem outra intenção que o bem comum poder ser melhor prosseguido. Todas as leis devem dirigir-se sempre à utilidade pública, não segundo a opinião vulgar, mas de acordo com o parâmetro da sabedoria.
- A “filosofia de Cristo” que o próprio Cristo chama um renascimento não é senão a restauração da natureza fundada boa.
- Os que adornam os mosteiros com custo excessivo, quando tantos templos vivos de Cristo estão em perigo de morrerem à fome, tiritam despidos, e são torturados pela falta dos bens necessários, parecem-me culpados de um crime capital.
- Não nego que procuro a paz sempre que possível. Sou a favor de ouvir ambos os lados com ouvidos bem abertos. Amo a liberdade. Não servirei, nem posso servir nenhum partido .

[FTM]

terça-feira, 2 de março de 2010

«A histeria de novo»

As audições promovidas pela Comissão de Ética transformaram-se no que seria de esperar: um espectáculo penoso, recheado de heróis improváveis e de malandros impenitentes que se digladiam entre si, a reboque dos mais diversos interesses partidários.
Para começar, convém dizer que as intenções da Comissão eram, já de si, insondáveis. Discutir, em abstracto, a liberdade de expressão sem especificar os limites do debate nem as condições em que este se exercia permitiu que coubesse lá tudo e mais alguma coisa: das manobras do primeiro-ministro à inverosímil "cabala" atribuída ao Presidente da República, passando, quem sabe, pela "ditadura da maioria" dos idos de Cavaco Silva. Perante a ausência de objectivos determinados, nada garante que a lista das pessoas a ouvir não possa vir a atingir proporções épicas e que, dentro de um ano, ainda estejamos às voltas com os mais diversificados atropelos à liberdade de expressão que se verificaram ao longo da nossa história.
Em segundo lugar, também não é fácil perceber o critério que presidiu à escolha das personalidades convocadas, nomeadamente à dos jornalistas. Pelo que percebi, e posso ter percebido mal, cada partido escolheu os jornalistas que lhe convinha, o PSD as hipotéticas vítimas, o PS os supostos amigos e o Bloco, beneficiando da confusão reinante, os que podiam comprometer o Presidente da República. Esta mistela, como é bom de ver, não augurava nada de particularmente bom. Infelizmente, o que se seguiu ultrapassou as piores expectativas. E se os políticos, para variar, se têm saído mal de todo este imbróglio – basta ver a incompetência da generalidade dos deputados a quem está entregue esta Comissão – não se pode dizer que os jornalistas tenham primado pela elevação.
O que se assistiu nesta primeira semana de audições é apenas um sinal do que nos espera nos próximos tempos: uma série de egos desorbitados, várias acusações fúteis e os previsíveis ajustes de contas de que ninguém sai a ganhar. Eu sei que, neste momento, Mário Crespo é uma das vítimas da liberdade e que nessa qualidade deve, segundo alguns teóricos, ser alvo da solidariedade de todos quantos não estão "vendidos" aos interesses do engº Sócrates. Ora, eu não estou, nem nunca estive "vendida" aos interesses do engº Sócrates, mas considero que a actuação de Mário Crespo na Comissão de Ética foi um exercício deplorável que enxovalha o jornalismo e a Assembleia da República. Um exemplo, como já disse, da histeria que hoje em dia reina em Portugal.»

[CCS, Correio da Manhã]

«A trela invisível»

«Existe uma forma subtil de o poder político premiar ou punir os órgãos de comunicação: através da publicidade institucional. Quando o órgão é manso, recebe o seu biscoito. Quando o órgão ladra e morde, a ração é controlada. Por isso é fundamental saber quanto se gasta e, sobretudo, onde se gasta o dinheiro público: a ‘liberdade de expressão’, hoje, não se faz com comissões prévias de censura. Faz-se com o livro de cheques na mão. A trela é a mesma.
Infelizmente, esta informação simplória foi recusada ao Parlamento e aos portugueses. O Bloco de Esquerda requereu (várias vezes) uma lista com as despesas em publicidade efectuadas em 2008/09 por ministérios, institutos ou empresas do Estado. Meses depois, o governo admite que não sabe, não quer saber e tem raiva a quem sabe. ‘Não há registos’, diz o ministro Lacão, uma resposta que faria sentido em Chicago, nos anos 20, e não num país da União Europeia, em 2010.
Percebe-se: se não há registos, não há abusos; se não há abusos, não há problemas; se não há problemas, tanto barulho para quê?»

[JPC, Correio da Manhã]