segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Patriotismos


«Na ausência de uma invasão castelhana, a esquerda, qual padeira de Aljubarrota, pegou em armas contra o FMI, lutando patrioticamente pela indigência nacional e pela sua hipotética soberania. O combate, hercúleo, diga-se de passagem, pode ter os dias contados, mas, em contrapartida, tem proporcionado tiradas grandiosas sobre os inimigos da Pátria e, melhor ainda, sobre os traidores que nela borbulham. É assim que qualquer dúvida sobre o estrondoso ‘sucesso’ que permitiu vender dívida soberana a juros de 6,7 por cento é vista como uma capitulação perante os malditos mercados que insistem em atacar-nos, fingindo desconhecer os méritos do engº Sócrates e os dados da execução orçamental de 2010, um ano exemplar, no qual a despesa disparou e o défice diminuiu graças ao fundo de pensões da PT.
Perante este quadro mental, qualquer patriota que se preze deve pois evitar falar de qualquer problema nacional, renunciar definitivamente ao debate e elogiar abundantemente o actual Governo de forma a oferecer ao mundo, e à Europa em particular, uma visão idílica de um país endividado e à beira da bancarrota, onde o desemprego dispara e o crescimento económico soçobra. Se tal não funcionar, como é natural que não funcione, sobra ao patriota em causa a opção pela luta armada: bater o pé aos especuladores, dar murros na mesa dos mercados, insultar a srª Merkel, e de passagem o sr. Sarkozy, e berrar histrionicamente contra a intervenção do FMI, esse papão que ameaça invadir-nos sob pretexto de que não podemos continuar a emitir dívida sobre dívida, durante tempo indeterminado. Para a esquerda, obviamente, podemos, até porque, em última análise, os mercados que nos atacam são os mesmos que nos continuarão a emprestar dinheiro indefinidamente.
Do outro lado da barricada encontra-se, naturalmente, a direita, que, na feliz expressão do ministro Santos Silva, 'saliva' perante a chegada do FMI para, com o seu beneplácito, poder dar asas à sua tenebrosa política contra o Estado Social que o próprio engº Sócrates se tem encarregado de desmantelar. Escusado será dizer que esta radiosa visão das coisas, onde os ‘bons’ combatem patrioticamente os ‘maus’, não resiste à mais elementar análise. Porque o que a esquerda parece não perceber é que, com ou sem FMI, o país vai ter mesmo de mudar de vida. É a vida.»




quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Novo ano, nova hora


O «A Torto e a Direito» mudou de hora: das 22h para as 23h. Mas sempre aos sábados. Em breve, os vídeos do programa estarão disponíveis no blogue.

Figuras tristes



«A campanha de Alegre mete dó. Não apenas pela forma desesperada como o bardo vai rapando o latão do lixo dos escândalos pífios (o ‘caso BPN’, o ‘caso das escutas’) para atacar Cavaco. Mas porque o homem nem se apercebe que o seu principal adversário não é Cavaco; é o PS, que o deixou entregue ao seu destino, sem se comprometer com a campanha. Não é preciso olhar para as sondagens para saber que o largo do Rato não morre de amores pelo seu candidato. Basta acompanhar as suas deambulações: todos os dias, as televisões apresentam as ‘arruadas’ de Alegre. E o que espanta é a ausência. Quando muito, Alegre tem meia dúzia de gatos pingados que o ouvem entre o bocejo e o ronco. Como foi possível chegar a isto? Fácil: pela alienação de todas as partes. A esquerda ‘independente’ que o apoiou em 2005 não lhe perdoou a rendição; e o aparelho não lhe perdoou a independência de 2005. Alegre não é apenas um homem só; é, coisa mais triste, uma contradição ambulante.»

[JPC, no Correio da Manhã]