«Na ausência de uma invasão castelhana, a esquerda, qual padeira de Aljubarrota, pegou em armas contra o FMI, lutando patrioticamente pela indigência nacional e pela sua hipotética soberania. O combate, hercúleo, diga-se de passagem, pode ter os dias contados, mas, em contrapartida, tem proporcionado tiradas grandiosas sobre os inimigos da Pátria e, melhor ainda, sobre os traidores que nela borbulham. É assim que qualquer dúvida sobre o estrondoso ‘sucesso’ que permitiu vender dívida soberana a juros de 6,7 por cento é vista como uma capitulação perante os malditos mercados que insistem em atacar-nos, fingindo desconhecer os méritos do engº Sócrates e os dados da execução orçamental de 2010, um ano exemplar, no qual a despesa disparou e o défice diminuiu graças ao fundo de pensões da PT.
Perante este quadro mental, qualquer patriota que se preze deve pois evitar falar de qualquer problema nacional, renunciar definitivamente ao debate e elogiar abundantemente o actual Governo de forma a oferecer ao mundo, e à Europa em particular, uma visão idílica de um país endividado e à beira da bancarrota, onde o desemprego dispara e o crescimento económico soçobra. Se tal não funcionar, como é natural que não funcione, sobra ao patriota em causa a opção pela luta armada: bater o pé aos especuladores, dar murros na mesa dos mercados, insultar a srª Merkel, e de passagem o sr. Sarkozy, e berrar histrionicamente contra a intervenção do FMI, esse papão que ameaça invadir-nos sob pretexto de que não podemos continuar a emitir dívida sobre dívida, durante tempo indeterminado. Para a esquerda, obviamente, podemos, até porque, em última análise, os mercados que nos atacam são os mesmos que nos continuarão a emprestar dinheiro indefinidamente.
Do outro lado da barricada encontra-se, naturalmente, a direita, que, na feliz expressão do ministro Santos Silva, 'saliva' perante a chegada do FMI para, com o seu beneplácito, poder dar asas à sua tenebrosa política contra o Estado Social que o próprio engº Sócrates se tem encarregado de desmantelar. Escusado será dizer que esta radiosa visão das coisas, onde os ‘bons’ combatem patrioticamente os ‘maus’, não resiste à mais elementar análise. Porque o que a esquerda parece não perceber é que, com ou sem FMI, o país vai ter mesmo de mudar de vida. É a vida.»
Do outro lado da barricada encontra-se, naturalmente, a direita, que, na feliz expressão do ministro Santos Silva, 'saliva' perante a chegada do FMI para, com o seu beneplácito, poder dar asas à sua tenebrosa política contra o Estado Social que o próprio engº Sócrates se tem encarregado de desmantelar. Escusado será dizer que esta radiosa visão das coisas, onde os ‘bons’ combatem patrioticamente os ‘maus’, não resiste à mais elementar análise. Porque o que a esquerda parece não perceber é que, com ou sem FMI, o país vai ter mesmo de mudar de vida. É a vida.»
[CCS, no Correio da Manhã]